Erva daninha é daqueles espetáculos que a gente não esquece. Seja pela dramaturgia esperta, seja pela atuação apaixonada. Em ambos os casos, mérito de Adélia Carvalho e Walmir José, que, na escrita ou em cena, realizam comédia de muito bom gosto. Soma-se à capacidade dos dois a experiência de Wilson Oliveira, que, diretor, soube valorizar o texto, aninhar personagens e dar mais inteligência à produção de Ana Jardim. O resultado poderia ser apenas mais uma peça de destempero conjugal. Não é.
A montagem se faz necessária por várias razões. Há mensagens à sombra do que é dito. A começar pelos buracos feitos no telhado por marido e mulher. Todo casal sabe bem o que é abrir brechas. Sabe do tempo que passa batido, esquecido – brilhante a sacada do despertador perdido no sótão, que, vez por outra, dispara perturbador. Há ainda – cada qual à sua maneira –, o cultivo do mato que nasce simplesmente, mantido no pequeno vaso de restos. Não é preciso ter sido casado para ser arrebatado por Erva daninha. Basta, alguma vez, ter sentido na pele as agruras da solidão a dois.
Não bastasse palavra de fôlego, Erva daninha tem Walmir José. Por entender o segredo do instante que antecede a ação, o professor se apresenta com verdade admirável. Tem a manha de ritmos e nuances. Walmir trata o silêncio como quem diz poesia e é capaz de, numa única frase – característica de sua dramaturgia –, cruzar assuntos distintos com as mais diversificadas intenções. Adélia Carvalho, sem carregar a mão, também consegue ganhar a plateia dentro e fora das quatro paredes. Mostra-se generosa no jogo da cena.
O cenário de Ed Andrade, em níveis, é limpo e funcional. O plástico-bolha de fundo reforça o conceito da criação. Richard Zaíra ilumina com eficiência e, assim como a trilha original de Kelly Ellaine, tem papel auxiliar importante na edição enxuta de cena a cena. Sem barrigas ou delírios criativos, com marcações limpas e longe dos gabinetes comuns, Erva daninha é programa para quem sabe que nem tudo que brota é flor.
ERVA DANINHA
Cia. Teatral As Medéias. Teatro João Ceschiatti (Palácio das artes), Av. Afonso Pena, 1.537, Centro. Tel. 3236-7400. Hoje, às 21h. Ingressos: R$ 12 (postos do Sinparc).
Estado de Minas - Jefferson da Fonseca Coutinho - 12/2/10
Nenhum comentário:
Postar um comentário