Jefferson da Fonseca - Mostra Tua Cara

domingo, 1 de julho de 2012

A caneta espiã do 007



Jorge Tadeu, o Curió, foi parar sozinho no Hospital de Pronto-Socorro, abatido por ardência aguda, causada por corpo estranho na parte traseira baixa do quadril. O raio-x revelou o objeto: uma caneta especial, com 16,5cm, equipada com micro câmera espiã 007. O rapaz, casado, envergonhadíssimo, não teve coragem de encarar a médica de metro e oitenta, plantonista, de cara amarrada e braços de caminhoneira. Depois de examinar a fundo o buraquinho equidistante das bordas, a doutora Dasdor apertou o Curió: “Foi ou não foi o senhor quem introduziu a esferográfica?”. Jorge Tadeu, flanelinha, meneou a cabeça, dizendo que não. “Sei. O senhor vai receber a medicação e será encaminhado ao bloco. Vamos remover a peça até o meio-dia”.

Na salinha da casa de urgências do SUS, enquanto doutora e equipe cuidavam do protocolo para o procedimento cirúrgico, Curió ficou a reviver os detalhes da ação dramática, que culminou na agressão do fiofó em chamas. Lembrou-se de quando comprou o acessório espião, há dois dias, na mão do China: “Fima tudo. É do 007. R$ 29,99, si. Duas hora de fime. Vitenove novetanove”, ofereceu o comerciante de olhinho rasgado e sotaque carregado. Curió não pensou duas vezes. Há muito sonhava filmar a cunhada no banho. O flanelinha, dono de rua na Região Centro-Sul de Belo Horizonte, pediu para um comparsa tomar conta do quarteirão e subiu mais cedo para casa. Queria malocar a caneta 007 no banheiro do cafofo, antes da cunhadinha voltar da escola.

Martinha, sob as águas, nem imaginava que na toalha amarela, dependurada no basculante de alumínio, estava a caneta espiã, presa com fita crepe. Plantada, a micro câmera captava a estudante nua, noiva de Borel, dono de boca de fumo. A moça, ensaboada, estranhou a posição do pano embolado, apontado para o box. Apressou o enxágue e catou a armação. Assustada com o objeto curioso, do tipo usado em filmes de espionagem, ela desconfiou de Curió – o único em casa naquela hora, já que a irmã, mulher do tarado, ainda estava no trampo, vendendo cachorro-quente. Martinha pegou o celular no bolso da bermuda sobre o tampão da privada e pediu ajuda ao Borel. Não deu cinco minutos para o traficante meter o pé na porta e prensar Curió na parede.

“Foi eu! Foi mal, Borel! Foi mal! É que eu sou doente! Doente, mano! Perdoa!”, esperneou o flanela franzino. Borel não fez muito. Segurou-o, apenas. Tyson, braço forte do movimento, foi quem baixou as calças molhadas do sujeito e introduziu, sem dó, a caneta espiã na parte traseira do quadril mirrado.

– Não! Não, Borel! Não, mano! Perdoa! Perdoa…
– Meu senhor! Calma, meu senhor!  Acorde!
– Não… não…  ah? Ah…

Curió abriu os olhos diante da enfermeira bocuda. Ainda meio grogue pela anestesia, enfim, estava livre da canetada no reto. Nem sentiu o trabalho da equipe comandada pela doutora Dasdor, de metro e oitenta. Na volta ao aglomerado, ganhou novo apelido: Bunda. James Bunda!


Vida Bandida - Jefferson da Fonseca Coutinho - 2/7/12

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