Droga barata que já vem arrasando a vida de gente graúda, o crack é mote de espetáculo bastante oportuno, em cartaz em Belo Horizonte. Te quero como queres, me queres como podes faz duas apresentações, amanhã e depois, no Teatro Sesi Holcim. De estrutura simples, limpa, com apoio cenográfico de projeção de vídeo, a produção aposta força bruta em texto e interpretação. Estão na poesia e no elenco o que há de pior e melhor em Te quero..., sob a direção geral de Orlando Orube.
Com pretexto e elenco de qualidade acima da média nas mãos, Orube bem que podia ter evitado o uso de clichês. O foquinho no cachimbo, de cara, por exemplo, é informação esfregada ao espectador. Capricho de mise-em-scène, apenas. O vídeo (ainda que tecnicamente bem realizado), em parte, também não escapa de quadros em composições óbvias ao tema, como mendicância e violência sexual. Está no jogo com o plano da realidade, no congelamento da imagem cenográfica, o melhor uso multimídia. Estabelece-se ali diálogo essencial à proposta mais requintada do diretor.
Percebe-se logo no off de abertura, interpretado por Maria Alice Rodrigues, que Te quero... é trabalho de ator. A atriz sabe bem como tratar a poesia e a enriquece com absoluta sinceridade. Enverga respiros, pausas e pontuações. Aliás, há de constar para registro a entrega das duas atrizes à empreitada. Renata Duarte Dutra, do começo ao fim, joga de igual para igual com Maria Alice. Juntas, completam-se em ação e fazem de tudo para não afrouxar nem mesmo as marcações mais pobres da direção – aquelas em que as duas se movimentam repetidamente, colada uma à outra.
Aos ouvidos, fica a sensação de que o texto de Aristides Vargas, na tradução e adaptação de Orube, é muito melhor poesia que teatro. A trágica história das meninas Catarina e Miranda, alinhavada com idas e vindas ao passado, tem tão mais força em atmosfera poética que, por vezes, chega a soar descolada no palco. Parece inverossímil que duas garotas de rua naquela condição “terminal” façam uso do vocabulário sofisticado trazido à luz. Ainda mais com tamanho empenho para caracterização realista – Renata e Maria Alice chegam a desaparecer completamente em Catarina e Miranda.
Além da performance valente das intérpretes, são muitos os motivos para não deixar passar batido Te quero como queres, me queres como podes. O trabalho de Orube e companhia é de grande contribuição na luta contra o crack. Mensagem obrigatória aos pais, educadores e homens de bem de todas as idades e camadas sociais. Talvez até, quem sabe, a peça contenha o óbvio necessário às vítimas do vício. Só o plano final na parede, imagem-corpo-poema, acrescido de suspiro e intenção, vale o programa e a lição.
Te quero como queres, me queres como podes
Amanhã e sábado, às 21h, no Teatro Sesi Holcim, Rua Padre Marinho, 6, Santa Efigênia, (31) 3241-7332. Ingressos: R$ 24 (inteira) e R$ 12 (meia-entrada).
Jefferson da Fonseca Coutinho - Estado de Minas
Com pretexto e elenco de qualidade acima da média nas mãos, Orube bem que podia ter evitado o uso de clichês. O foquinho no cachimbo, de cara, por exemplo, é informação esfregada ao espectador. Capricho de mise-em-scène, apenas. O vídeo (ainda que tecnicamente bem realizado), em parte, também não escapa de quadros em composições óbvias ao tema, como mendicância e violência sexual. Está no jogo com o plano da realidade, no congelamento da imagem cenográfica, o melhor uso multimídia. Estabelece-se ali diálogo essencial à proposta mais requintada do diretor.
Percebe-se logo no off de abertura, interpretado por Maria Alice Rodrigues, que Te quero... é trabalho de ator. A atriz sabe bem como tratar a poesia e a enriquece com absoluta sinceridade. Enverga respiros, pausas e pontuações. Aliás, há de constar para registro a entrega das duas atrizes à empreitada. Renata Duarte Dutra, do começo ao fim, joga de igual para igual com Maria Alice. Juntas, completam-se em ação e fazem de tudo para não afrouxar nem mesmo as marcações mais pobres da direção – aquelas em que as duas se movimentam repetidamente, colada uma à outra.
Aos ouvidos, fica a sensação de que o texto de Aristides Vargas, na tradução e adaptação de Orube, é muito melhor poesia que teatro. A trágica história das meninas Catarina e Miranda, alinhavada com idas e vindas ao passado, tem tão mais força em atmosfera poética que, por vezes, chega a soar descolada no palco. Parece inverossímil que duas garotas de rua naquela condição “terminal” façam uso do vocabulário sofisticado trazido à luz. Ainda mais com tamanho empenho para caracterização realista – Renata e Maria Alice chegam a desaparecer completamente em Catarina e Miranda.
Além da performance valente das intérpretes, são muitos os motivos para não deixar passar batido Te quero como queres, me queres como podes. O trabalho de Orube e companhia é de grande contribuição na luta contra o crack. Mensagem obrigatória aos pais, educadores e homens de bem de todas as idades e camadas sociais. Talvez até, quem sabe, a peça contenha o óbvio necessário às vítimas do vício. Só o plano final na parede, imagem-corpo-poema, acrescido de suspiro e intenção, vale o programa e a lição.
Te quero como queres, me queres como podes
Amanhã e sábado, às 21h, no Teatro Sesi Holcim, Rua Padre Marinho, 6, Santa Efigênia, (31) 3241-7332. Ingressos: R$ 24 (inteira) e R$ 12 (meia-entrada).
Jefferson da Fonseca Coutinho - Estado de Minas
Foto: Marcílio Gazzinelli
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