Jefferson da Fonseca - Mostra Tua Cara

segunda-feira, 6 de agosto de 2012

O crime das seis pistas

Ele, advogado. Ela, delegada de polícia. Colodetti tramou tudo logo que soube que a mulher andava de caso tórrido com o melhor amigo de infância. O sujeito passou mês e meio arquitetando o assassinato e o sumiço do corpo da traíra. Não queria deixar pistas. Na noite da execução, tomado por ódio descabido, ainda preparou jantar de despedida para a policial de carreira. Ao chegar do fim de tarde, de sexo até doído, surrado pelo amante, Salete encontrou mesa posta e flores na sala como nunca. Música lounge para o clima intimista. O homem, gourmet, picava tomates miúdos para a salada fina. Sobre a mesa, duas velas coloridas em chamas. Dissimulado, fez-se gentil:

– Imaginei que talvez você estivesse com fome...
– Sim. Alguma comemoração? Você não é disso.
– É. Mais ou menos. O escritório fechou parceria com São Paulo.
– Parabéns. Preciso de um banho.
– Claro.

A delegada seguiu para a suíte sem entender a cena. Há quase ano o relacionamento ruía. Cada um vivia mergulhado em dois mundos particulares de compromissos. Cafés, almoços e jantares entre os dois fazia tempo. Muito tempo. A última ceia, em julho do ano passado, foi um fiasco. Foi quando Salete revelou resultado de exame de saúde ao marido. Na ocasião, foi ela a preparar a comida. Ele chegou do escritório e quis logo saber:

– E então? O que o médico disse?
– Não posso ser mãe. Tenho o útero seco.

De resto, nos pratos, o silêncio. Desde então, cada um foi se ajeitando num rumo. Ainda que sob o mesmo teto, de sono na cama em comum. Ambos beirando os quarenta, viram os sonhos do filho se esvair. A situação piorou quando Colodetti propôs adoção.

– Tenho um colega no fórum... ele adotou uma menina e está feliz da vida...
– Está louco? Isso é assunto morto. Adotada nesta casa já me basta!

De volta à sala de dois ambientes no apartamento do Vale do Sereno, em Nova Lima, o veneno está na mesa. Em pó, diluído no prato e na bebida da policial. Mudo, Colodetti aguarda o gole ou a garfada fatal da mulher companheira.

Vida Bandida - Jefferson da Fonseca Coutinho

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