Jefferson da Fonseca - Mostra Tua Cara

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

O drama da invisibilidade


O Ismael, aguerrido companheiro de praça, está que não se aguenta de aborrecimentos com o filho adolescente. É de partir o coração almoçar com o amigo e vê-lo nem mexer na comida. “Cisca” – como diz o velho Botelho – com o garfo de um lado para o outro do prato e nada. Ontem, na Região Central, próximo ao Arrudas, o quadro foi esse em mesa do Bar da Cida. Osmar, Ismael e eu, pais dedicados, debatemos as crises mais comuns da pior fase da juventude. O Osmar também já passou por maus bocados com os males da invisibilidade e do descompasso entre pais e filhos. Teve que ser ainda mais severo em casa pela salvação da família. “Cortei tudo: internet, celular, mesada, passeios... Agi rápido antes que a vaca fosse pro brejo. Onde já se viu? Essa molecada de 14 a 17 não tem limite. Quem não aprende em casa, quebra a cara na rua…”, garante Osmar.

O Ismael não se conforma com a transformação do filho único. “O menino era meu companheiro… a gente fazia tudo junto. Era alegre, divertido… nunca gostou muito de estudar, mas estudava, ia bem na escola… aí, de um ano pra cá, não quer mais conversa e tudo tem que ser do jeito dele. Outro dia, só porque reclamei que ele tava ficando muito tempo na rua, me respondeu mal, dizendo que não é mais criança e que já sabe o que é melhor pra ele…”, lamentou, arrasado, o companheiro Ismael. Tomei nota – com a permissão dele, claro – para abordar o assunto em Bandeira Dois. “Isso, sim, é tema para mais de metro”, ressaltou Osmar. É. Delicado e urgente os embates com os adolescentes. O que sei é que não podemos desistir deles. A eles pertence o amanhã. Tenho um conhecido que desistiu do filho. “Lavo as minhas mãos”, disse-me na ocasião. O garoto, hoje, crescido, cumpre pena em Ribeirão das Neves.

Problema maior do Ismael é que o filho passou a agir às escondidas. Numa dessas ações, menor, no ano passado, surrupiou a chave do carro da mãe e arrebentou o utilitário, novinho, numa curva da Lagoa da Pampulha. Perda total. O carro é o de menos – material, tem seguro. Já o moleque, por muito pouco não ficou entrevado. “Agora, tá bebendo e fumando que nem chaminé, Josiel. Difícil para um pai dizer isso… mas até dinheiro ele tá tirando. Pegou o cartão bancário da mãe e fez uma limpa na conta dela. Não sei mais o que faço…”, desaba. Ismael garante que envolvimento com droga não há. “É servegonhice mesmo. Servegonhice. Devia ter sido mais duro com esse moleque quando morava com ele. A culpa é minha”, revolta-se. Difícil reanimar o companheiro – bastante presente, apesar da separação.

Liguei para o velho Botelho, conforme combinamos, Ismael. Taí a opinião do pai: “O tempo passa e, com a presença e participação da família, a falta de juízo se ajeita. Fácil não é. Mas, meu filho, é absolutamente possível ser justo e exemplar. Só não podemos deixar de acreditar nos nossos filhos. Nunca. Não podemos desistir deles, em hipótese alguma. Se a família não acreditar, quem vai dar conta de acreditar? Quem vai acolher? Não há fórmula. O que temos são algumas pistas de como não devemos agir. Um pai, adulto, responsável, não pode ficar de mal, emburrado, sem ação. Precisa se desdobrar para não se afastar do filho. Pai que é pai tem habilidade para ‘negociar’. Sabe ceder e avançar, no compasso da circunstância, no adiantado da hora. Quando o pai finge que o filho não existe, ambos deixam de existir”.

Bandeira Dois - Josiel Botelho

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