Beatriz, menina ainda, se viu num triângulo amoroso que não podia acabar bem. Prometeu seu coração ao Leonardo, mas seu amor quis o Fabinho, com quem sonhou ter filho. Leo, rapaz mulherengo e cheio de complicações com drogas, mãe e padrasto. Já o Fabinho, trabalhador, foi obrigado a pegar cedo no batente. Pequeninho, aos 8 anos, já ajudava a vender galinhas em bairro da Zona Norte de Belo Horizonte. Os dois amigos, embora crescidos e criados juntos, tinham visões bem diferentes de futuro. O envolvimento da Bia com o Leo começou no dia em que ela comemorou 15 anos, num churrasco oferecido pelo pai. A mãe dela, dona Silvia, até que compareceu, mas não ficou. Não aguentou ver o ex-marido feliz da vida com a nova companheira. A aniversariante não deu mole para a tristeza e, entre gente querida, cedeu às insistentes investidas do Leo, vizinho de portão.
Quem sofreu horrores foi o Fabinho. Reservado, órfão de mãe, morando apenas com o pai, vigilante noturno, guardou a dor em silêncio. Amigo mais próximo do Leo, ainda teve que ouvir conversa para boi dormir por telefone: “Véi, ela tá doidinha... Só não rolou ontem, depois da aula, porque o “bagaça” tá sem trampo e, agora, fica todo dia lá, colado na velha. Tentei levar a mina pro quarto, mas o filho dele tava lá. Tá foda dividir o quarto com o pivete”. E ainda, sabendo que o pai do Fabinho passa as noites fora de casa, foi mais longe: “Aí... arruma um esquema pra eu ir com ela pra sua casa. Quebra essa!”. Fabinho não arrumou esquema, mas não amarrou o quarto para o Leo. E assim, durante quase um ano, foi na cama dele, que a Bia teve o quadril surrado pelo amigo.
Com o sofrimento da situação o amor só aumentou. Vai entender. Fabinho vivia de saudades da mãe, levada por câncer dos mais violentos. Bia, sempre perfumada, deu novo cheiro de mulher à casa. Já que o “seu” Miguel, doído, depois que perdeu a esposa jamais foi visto acompanhado. Desde que Leo e Bia passaram a “ficar”, Fabinho até engatou uns rolos para tentar tapear os sentimentos. Mas, no fundo da alma, só havia lugar para a colega de sala, comprometida com o amigo ordinário e pegador. Além da Bia, havia lista de dezena de ficantes. Quando tentou levar outras moças para a casa do Fabinho: ouviu, na lata: “Não! Só a Bia!”.
Com a pilantragem do Leo, a mentirada em cima da Bia foi até longe demais. No dia em que completaram dois anos de sexo, a menina resolveu dar basta ao desaforo. Soube da boca de conhecida, arrependida, que se viu obrigada a abortar feto do sujeito. “Seu namorado é um monstro! Te conto essa pra não acontecer o mesmo com você”, disse a vizinha, na manhã de prantos. Horas depois, ouviu a confirmação da boca do próprio infeliz: “Foi bobeira dela. Parou de tomar remédio. Você sabe que não gosto de camisinha”. Fabinho estava na sala, tentando estudar, quando ouviu o primeiro palavrão dito por Bia, aos berros. A moça, fora de si, também plantou a mão na cara do canalha. Pausa na amizade do trio.
Mês depois, Bia e Fabinho se encontraram na padaria. “Um sorvete? Topa?”, ela convidou. “Por que não!?”, respondeu o moço, sorrindo, feliz com a oportunidade. Do passeio ao romance, um orgasmo. Na sala. Ela não quis o quarto. “Foi a melhor vez de toda a minha vida”, suspirou no sofá. Deixou a casa tão apaixonada que nem se importou quando soube que, daquele encontro, havia ficado grávida. Fabinho juntou economias e, com o apoio do pai, reformou a casa para receber Bia: “Casa comigo?” No bairro, corria em boca miúda: “Nasceram um para o outro”. Véspera do compromisso em cartório, no portão de Bia, armado, Leo, o ex, aparece para “lavar a honra”. Dois tiros na barriga e um na cabeça da noiva. “Não com meu amigo, vagabunda!” Fabinho, em frangalhos, jurou de morte o assassino, de quem nunca mais se teve notícia.
Vida Bandida - Jefferson da Fonseca Coutinho - 19/9/11
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