Thibau tinha o corpo fechado por parente de reza forte.
Criado por avó, o garoto cresceu valente, impossível. Quando não dava conta na
mão, havia sempre uma pedra ou pedaço de pau para fazer valer superioridade.
Não havia quem levasse a melhor em cima do moleque, rei da rua e dos campinhos
de futebol da Zona Norte – já na Região Metropolitana de Belo Horizonte. O líder,
o cara.
Com Thibau não tinha tempo ruim. Sob chuva ou sol, o moleque,
que não queria nada com os estudos, estava sempre pronto para se superar. Com
tanta vocação e talento para a rua, não lhe faltavam amizades cheias de má
intenção. O difícil ali, em bando, era saber quem era a pior influência – já
que, no grupo, não havia um único sujeito de juízo ou razão.
Thibau ainda não tinha 12 anos quando começou a roubar. De
início, coisa pouca: galinhas, enlatados e roupas no varal. Para as bicicletas
foi um pulo. Antes dos 15 já era puxador de carro profissional. Ganhou o
apelido de “Theflash”. Isso porque, no cronômetro, 8 segundos era o tempo
máximo que Thibau gastava para abrir qualquer automóvel.
Crescido, o sujeito fazia e acontecia. A polícia e as seguradoras
jamais haviam visto a sombra de Thibau. Todos que passaram pelo bando caíram ao
menos uma vez. Thibau, aos 19, sete deles no crime, orgulhava-se da condição de
“invencível”. Tuim, o amigo mais chegado e braço direito, puxava o coro: “O
Theflash é o cara!”.
Mas Theflash conheceu Efigênia, moça boa, evangélica e cheia
de encantos. Thibau jamais havia sentido algo parecido por qualquer sujeita de
saia. Bem apessoado, teve garotas aos montes. Pintava e bordava com duas, três,
quatro ao mesmo tempo. Com Efigênia, o futuro. Estudiosa, trabalhadeira, aos 22
anos, a crente era rara.
O encontro dos dois foi de cinema, debaixo de tempestade. Thibau,
ensopado, esperava brecha para atravessar a rua, quando a universitária lhe
ofereceu espaço sob a sombrinha florida. “Vai ficar resfriado”, sorriu a bela.
Ele não disse palavra. Apenas se aconchegou protegido para cruzar a via. O
cheiro bom dos cabelos negros, compridos, e a pintinha perto da boca carnuda marcaram
o marginal.
Ela estava a caminho da igreja. Dia de culto. Ele foi junto.
“Coincidência. É pra lá que tô indo... marquei com um amigo...”, disse.
Mentira. Thibau tinha outra parada com Tuim e outros três comparsas: assalto na
Região da Pampulha. No templo evangélico, na companhia de Efigênia, o marginal teve
o coração tomado por sentimento bom. Ergueu as mãos e fechou os olhos,
fortalecido, como nunca em quase 20 anos.
Thibau deixou de lado o bando e voltou a pedir a bênção à
avó. Retomou os estudos, arrumou trabalho e tomou jeito de gente decente. Com
Efigênia, foi feliz para sempre.
Vida Bandida - Jefferson da Fonseca Coutinho
Nenhum comentário:
Postar um comentário