Jefferson da Fonseca - Mostra Tua Cara

quarta-feira, 28 de novembro de 2012

Da alegria dos pequenos



Li escrito de um tal Oscar Wilde que diz: “Se queremos crianças melhores, precisamos torná-las felizes”. O dito me tocou a alma. Assusta-me os pequenos sem rumo que vejo espalhados por Belo Horizonte e região metropolitana. São muitos. E nem é preciso rodar demais para vê-los pedintes, longe dos pais e das salas de aula. Anteontem, depois das 22h30, num supermercado próximo à Avenida Nossa Senhora do Carmo, um grupo de cinco garotos – de no máximo 8 anos – pedia, divertido. “Moço, compra um biscoito pra nós”, sorriu a menina miúda, de saia curta e chinelas surradas.

“Isso é hora dos mocinhos ficarem na beira da estrada?”, perguntei. O mais alto – mais franzino, porém – respondeu duro com intenção de homem feito: “A gente dorme tarde, tio. Compra...”. Nisso, antes que o garoto terminasse o pedido, um segurança se aproximou e a turminha partiu em disparada. “Não dê atenção a eles não. Todo dia é isso”, disse-me o homem uniformizado. A cena dos garotos correndo e pulando, às gargalhadas, no acostamento, rumo ao trevo do Bairro Belvedere, não me sai da cabeça.

Em casa, pelo computador, vejo a cena de violência no Aglomerado da Serra. Confronto da polícia com os moradores, tiroteio e morte. Ônibus incendiado, sujeitos de bem desesperados e revoltados com a ação policial. Em particular, outra cena envolvendo garotos me chama a atenção: um pequeno, de pouco mais de metro, exibindo o cofre do ônibus como se fosse um troféu. Madrugada longa de reflexão. De olho no filho, ainda recém-nascido, não consegui pegar no sono. O pensamento nas crianças perdidas precisava ganhar a caderneta de papel pautado.

Lembrei-me do Kiko, amigo de infância, que, aos 8 anos, vendia picolé nas ruas para ajudar a mãe e os irmãos menores. O garoto deixava cedo o barracão e ia para a sorveteria do Matias. De lá, rodava o bairro com a caixa de isopor pesada, abarrotada de picolés. Na época, lembro-me bem, queria ser como o Kiko. Cheguei a acompanhá-lo algumas vezes, escondido do meu pai. Numa dessas aventuras, levei uma bronca do velho Botelho para nunca mais. Ele não disse muito. Sua expressão dizia tudo. Não era para menos: sumi por uma tarde e ele chegou a pedir ajuda da polícia.

Mais de três décadas depois, a madrugada se faz dia nas sombras das preocupações. Na caderneta, em linhas corridas, rabiscos pelo futuro dos meus filhos, pelos mocinhos pedintes do supermercado e pelas crianças do Aglomerado da Serra. Fé e atitude. Já que não posso dar conta dos rebentos do mundo... ao menos uma prece pública pela alegria dos pequenos: que sejam felizes! Melhores e felizes!

Bandeira Dois - Josiel Botelho





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