Boa
moça estava ali, no apartamento 101, do predinho cor de terra. Suzane,
funcionária pública e cheia de virtudes, só não conseguia se casar. O sonho de
vestir-se de branco, com os panos herdados da mãe, parecia ainda mais distante
com a chegada dos 40 anos. Laís, amiga desde os tempos de faculdade e colega de
repartição, já havia se casado três vezes. Era ela quem ajudava Suzane a lidar
com o sonho ameaçado: “Casamento é besteira. Se eu pudesse voltar no tempo,
amiga, pegava a fortuna que papai gastou com festa, metia o pé na bunda daquele
traste do meu primeiro marido e ia cair no mundo. Se ia”.
Pouco
adiantava as conversas com Laís. Suzane queria vestir-se de noiva e ponto. O
problema ali, com a bela cheia de carnes, não era companhia. Homem tinha aos
montes na cola da administradora. Todos casados. Caso para estudo a atração que
os sujeitos comprometidos tinham pela morena de olhos grandes e cheiro cítrico.
Com o último, um advogado de carreira, o romance durou sete anos. O sujeito,
renomado, dizia que estava esperando o melhor momento para se separar da
mulher. Jurou que levaria Suzane ao altar de véu e grinalda, pela Igreja
Católica Brasileira. Marcou data e tudo. Por fim, aos prantos, ele deu para
trás numa tarde de domingo. “Desculpe-me”, chorou o bigodudo.
Antes
do bigode teve um tal Galego, de Sete Lagoas. Com esse a decepção foi ainda
maior. O camarada, maior pinta de machão, casado com médica de família
tradicional e pai de dois garotos, mantinha vida secreta no colo de muitos
moços. Depois de um ano juntos, Suzane quase morreu de tristeza ao saber a
ficha do sujeito. Também teve o Jonas, o Elenilson e o César. Todos,
comprometidos, diziam-se apaixonados por Suzane. A bela, com sina incrível para
amante, era quem chutava sempre o pau da barraca. “Homem não tem iniciativa.
Chega uma hora que não dou conta. Facilito a coisa e acabo de vez com a
situação. Não sei o que acontece comigo, Laís...”, desabafou com a amiga, em
noite de bebedeira.
Os
40 anos chegaram num pulo. Em crise, pediu tempo até para as amizades. Sábado
de chuva e falta de compromisso. Sozinha, Suzane decidiu abrir garrafa de vinho
para se embebedar de vazio. “Feliz aniversário”, sussurrou para si mesma. Na
última taça, foi até o baú do quarto de passado... lembrou-se da mãe morta e
vestiu-se de noiva. Aproveitou o som da valsa alegre, vinda do salão de festas
do prédio vizinho, e dançou a dança da solidão.
Vida Bandida - Jefferson da Fonseca Coutinho
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