Jefferson da Fonseca - Mostra Tua Cara

terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

A professora e o bandido de gravata


Tudo em 24 horas: a morte da mãe e a prisão do marido. Katlyn já havia passado por maus bocados, mas nada comparado aos dois dias daquele dezembro. A mãe da professora, dona Lilica, já tinha sobrevivido a dois infartos. Katlyn, mesmo sabendo da saúde debilitada da mãe, não esperava perdê-la para um resfriado que se fez pneumonia. Desgraça pouca é bobagem, a moça, de 26 anos, viu o marido bonitão ser algemado no velório da mãe. Gregório, de gravata, foi enfiado no camburão sob os gritos da mulher: “Não! Meu marido, não! Por que? Por que, meu Deus?”

Gregório se envolveu com gente da pesada e acabou por meter os pés entre as mãos. Katlyn, corretíssima, nem em pesadelo podia imaginar as falcatruas do companheiro, cada vez mais “bem sucedido”. “Ele trabalha muito, coitado. Graças a Deus, agora, tá ganhando um bom dinheiro. Tá dando certo na vida”, dizia. Mal sabia a professora. Gregório falsificou documentos, movimentou dinheiro sujo, desviado de grande empresa, e acobertou carros roubados, mandados para a Bolívia. Investigado, o esquema veio abaixo.

Mandado de prisão expedido, não teve meu pé me dói. Gregório foi detido e não conseguiu responder ao processo em liberdade. Os cabeças do esquema se safaram. Já o administrador e outros sete sujeitos miúdos, juntos, pegaram 65 anos de cadeia. Katlyn, quando ouviu a sentença do juiz, desabou no fórum da Região Metropolitana de Belo Horizonte. Moça reservada, de poucos amigos, a professora amargou solidão de doer. Envergonhada, ela queria distância dos familiares. “Não preciso de nada. Obrigada!”, cortava, uníssona, qualquer um que lhe estendesse a mão.

Domingo de visita. Primeiro encontro depois da condenação. Katlyn tratou do cabelo, vestiu roupa nova e fez maquiagem para esconder as olheiras. Queria estar bonita para o marido. Movida por saudade sem fim, a mulher chegou bem cedo à penitenciária. Encarou a fila e a demora para a revista. Nua, suportou com nojo e revolta o constrangimento da situação. “Aperta e solta a vagina dez vezes, minha filha! Vai!”, ordenou a agente gorda, masculinizada. A professora também viu a marmita que preparou para o marido, cheia de carinho, ser revirada como se fosse lixo. Sentiu desaforos e teve vontade de desistir.

Frente a frente com Gregório, Katlyn reuniu forças para sorrir. Sorriu comedida, sem tocar no assunto. Segurou a reação de tristeza ao ver o homem bonito, bem apessoado, reduzido ao sujeito magrelo sem graça, de cabeça raspada e vestido de laranja. “Fiz pra você. É de abacaxi… O que você mais gosta”, disse, em frangalhos. Gregório abriu a marmita revirada e sentiu o cheiro bom da massa preparada pela mulher. “Tá bonita. Com um cheiro bom… É aquele perfume que eu te dei?”. Katlyin não disse palavra. Abraçou-o, simplesmente, como se pudesse parar o tempo.

Vida Bandida - Jefferson da Fonseca Coutinho

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