Jefferson da Fonseca - Mostra Tua Cara

segunda-feira, 11 de julho de 2011

Conversa de salão

Fala-se muito em salão. No da Matilde, então, é uma beleza. Lá, toda mulher, arrumada, até que parece ser bem feliz. Não importa a idade, a condição financeira ou o estado civil. Agenda lotada regularmente, a loja chique faz sucesso há mais de 15 anos. Além da clientela fixa, vez por outra, o acaso leva alguém de passagem ao estabelecimento. Foi assim com o Hugo, vendedor ambulante, que precisava dar um tapa no visual. "Dá para aparar o cabelo?", perguntou. "Vamos entrando", respondeu Matilde, aproveitando brecha na agenda. Zuleika, a manicure, pintava de vermelho as unhas de uma senhora feita no bisturi, que aparentava uns 70 anos. Odete, outra especialista, massageava o couro cabeludo de jovem e elegante madame. Matilde ofereceu ao Hugo a cadeira próxima às duas distintas clientes. Deu-lhe uma revista - dessas de muitas caras e pouco conteúdo - e desceu a tesoura. No entorno, o assunto parecia interessantíssimo. A cliente da Zuleika, metida a gostosona, dominava a cena:

– Eu não. Só tenho a agradecer por não ter que cuidar de marido. Homem envelhece muito mais que a gente. Tenho a cabeça de menina. Uso short e minissaia até hoje. O que é bonito tem que ser mostrado. Ninguém fala a idade que eu tenho.

– Não fala mesmo. Te dou no máximo 50.

– Já falaram em 35, menina. Faço 64, sábado agora.

– Inacreditável.

– E não tenho o menor problema em assumir a idade. Só não deixo o cabelo branco porque acho feio. Olha só a minha mão... Até a minha mão tá conservada. Vocês já viram a mão da Hebe Camargo?

– É feia demais.

– Pois é. Antigamente, eu ficava assim: "Porque fulano não casou comigo? Ou o sicrano ou o beltrano?". Hoje, dou graças a Deus. Sou solteríssima e enroladíssima! (risos) Outro dia, no supermercado, encontrei um ex-namorado, de quem eu gostava muito. Ele terminou comigo pra ficar com uma baixinha horrorosa. Eu era muito melhor que ela. Aí, quando eu bati o olho nele, quase cai pra trás. Horrível. Arrastando a perninha, um caco. E a baixinha lá, cuidando da bagacera. Fiquei até com dó da figurinha.

A Matilde, gente muito boa, bastante envergonhada com a conversa furada da faladeira, cobrou só a metade pelo corte do Hugo, que não resistiu e, antes de deixar o salão, colocou ponto final na conversa: "Se me permitem... A senhora aí, toda plastificada, é um gradissíssimo tribufu!"

Vida Bandida - Jefferson da Fonseca Coutinho - 11/7/11

Um comentário:

Caca disse...

hehehehe! Eu não teria coragem para dizer isso mas tenho de aplaudir o Hugo. Excelente, Jefferson! Meu abraço. paz e bem.