“Trabalho na Guaicurus. Conhece?”, perguntou Ariela. “Já ouvi falar”, respondeu Dorinha. O toque de tema infantil do celular da garota interrompeu a conversa. Ela identificou o número no visor e não quis atender. Deu “end” por três vezes e, por fim, desligou o aparelho. Pediu para ir ao banheiro e disse que estava melhor: “Minha gengiva já até parou de sair sangue”. As marcas deixadas pelo taco de sinuca do pai eram de fazer dó. As belas e longas pernas em vergalhões, mais uma vez, chamaram a atenção de Dorinha, que queria denunciar o velho. Quando Ariela voltou, a cantora tocou no assunto:
– Se eu fosse você denunciaria.
– Não adianta.
– Claro que adianta. Manda ele pra cadeia pra você ver.
– Ele já foi da polícia.
Ananias foi inspetor por quase três décadas. Linha-dura. Homem da lei, do tipo raro, incorruptível. Há cinco anos, aposentado, largou a família por causa de rabo de saia mais jovem. Uma mulata de boas carnes, ordinária até, que aproveitou ao máximo o dinheirinho suado do babão apaixonado e, depois, deu no pé com namoradinho baiano. Há pouco mais de mês, desde que foi largado, o ex-policial estava morando no JK. Apesar da surra, Ariela não escondia afeto pelo sujeito.
– É meu pai.
– Mas não tem o direito de bater em você. Olhe as marcas nas suas pernas.
– Não é nada.
– E o sangue na sua boca?
– Não tem nada a ver com ele.
– Mas não tem o direito de bater em você. Olhe as marcas nas suas pernas.
– Não é nada.
– E o sangue na sua boca?
– Não tem nada a ver com ele.
Enquanto conversavam, Dorinha preparou mesa para o café da manhã. O schnauzer, serelepe, fazia gato e sapato de brinquedinho desafinado. Com os bons tratos da vizinha do pai, Ariela foi se entregando à amizade. A doçura da desconhecida despertou-lhe sentimentos havia muito esquecidos. A menina de olhar assustado abriu a guarda e deixou correr assunto:
– Você se importa?
– Com o quê?
– Em tomar café com uma puta?
– Claro que não. Sou cantora da noite.
– Que que tem?
– Já fui tratada como garota de programa muitas vezes.
– Com o quê?
– Em tomar café com uma puta?
– Claro que não. Sou cantora da noite.
– Que que tem?
– Já fui tratada como garota de programa muitas vezes.
(Continua no próximo sábado)
Vida Bandida - Jefferson da Fonseca Coutinho - 18/9/10
Um comentário:
Cá estou novamente, Jeferrson, com sentimento de quero mais. Até o próximo. Abraços. Paz e bem.
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